segunda-feira, 8 de março de 2010

SERENATAS


A vida de qualquer pessoa é formada por ciclos, dependendo do que faz e de onde está. Mas do que ciclos, esses espaços de tempo são verdadeiros círculos, que se entrelaçam com o passar das horas, dos dias, dos meses e dos anos, criando, por fim, uma única história, que é a nossa existência.

Se o ciclo da minha infância foi vivido, aqui, em João Pessoa, espalhando pelas ruas de Cruz das Armas e de Jaguaribe um sem número de traquinagens e peraltices que ninguém esquece, o ciclo da adolescência e da juventude foi passado em Campina Grande, marcado, sem dúvida, pelos muitos sonhos e vivências próprias da idade.

Nos anos 60, ao embalo do programa A Hora Poética Campinense, que era transmitido pela Rádio Caturité, muitos dos sonhadores da época se reuniam no estúdio da emissora para declamar seus versos: era quase um ponto-de-encontro obrigatório, que contava com as presenças de Ronaldo Cunha Lima, Orlando Tejo, Eilzo Matos, Eduardo Ramires e tantos outros, cada um já iluminando o ambiente com as luzes brilhantes das suas inteligências.

Se o programa era levado ao ar das 5 às 6 da tarde, restava-nos, depois, pela frente, uma longa noite – principalmente às sextas-feiras – e uma pergunta no ar: o que fazer com a madrugada ? Por decisão unânime, resolvemos preenche-la com algumas serestas, tendo nascido, daí, o Clube do Bacurau, cujas sessões se alongavam até o nascer do dia.

Para receber a serenata, uma jovem era selecionada dentre tantas outras beldades. Feito a escolha, lá íamos nós, de violão a tiracolo, despertar a donzela premiada com as canções da época. Antonio Emiliano, o nosso violonista-mór, colocava uma escada no poste mais próximo e puxava de lá a energia que dava vida ao violão elétrico. E a seresta, feita assim de improviso, quebrava o silêncio da noite, enternecendo o coração dos que a ouviam. E assim, por muitas vezes, as serenatas do Clube do Bacurau contavam com vozes famosas, como as de Nelson Gonçalves, Orlando Silva, Roberto Silva e tantos outros, que nos acompanhavam, após suas apresentações na Borborema, nessas audições extras e inesquecíveis.

Hoje, as serenatas já não existem mais.

Resta-nos, no entanto, ainda, sonhar de olhos abertos com essas madrugadas que ficaram para sempre no passado com suas músicas que ainda ressoam em nossos ouvidos.

É como se as serenatas estivessem acontecendo hoje. Como se as cenas estivessem se passando agora. Como se os momentos felizes ficassem para sempre em nossa memória. Eternizados na música e na saudade.

(Crônica divulgada pela Rádio Tabajara, no dia 20/02/05)


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