quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

O CONTO DO MÊS









ETERNO CARNAVAL


Nunca conseguira entender direito o que realmente acontecera com seu casamento. A Marina era a mulher dos seus sonhos e razões não faltavam para isso: linda como uma boneca, de corpo perfeito, virtuosa, parecia uma santa. Casara-se com a impressão de que ganhara um grande prêmio. Uma mulher ímpar, dona-de-casa completa, mãe-de-família exemplar. Que mais poderia almejar ?
Cinco anos depois, apesar da aparente felicidade, sentia que lhe faltava algo muito importante. Não tinha coragem de comentar com a esposa (tão pura !) nem com os amigos mais chegados, que o julgavam o mais sortudo dos homens, vivendo ao lado de uma mulher tão bela e tão dedicada. Um casalzinho de filhos completavam o quadro. Jorge e Marina formavam, sem dúvida, um par invejável. Ele, um homem decente, honesto, fiel, advogado conhecido e de boas posses; ela, uma mulher de excelentes virtudes, vivendo sempre para o lar, excelsa na sua beleza e na pureza permanente dos seus gestos.

Em conversa com amigos, ouvindo confidências de um e de outro, acabou por descobrir o que estava tornando o seu casamento ensôsso e sem graça: o sexo. Desde a noite de núpcias, Jorge, por conta do respeito com que tratava a esposa, jamais foi além dos limites permitidos pela sua consciência, e Marina, por sua vez, nunca sequer insinuou algo mais ousado na hora de fazer amor. E ficaram os dois, por conta dessa respeitosa relação, na base do papai-e-mamãe, sem mais nada, além de poucos e insignificantes carinhos.

Com seus 30 anos, Jorge até que poderia ser mais vivido, menos tímido e capaz de alterar essa rotina. Mas não era. De tanto se dedicar aos estudos, tivera, antes do casamento, apenas algumas namoradinhas e, com elas, jamais chegara a lugar nenhum em se tratando de sexo, ficando apenas em alguns amassos inconsequentes. Tanto que se casara virgem.

Foi numa reunião de amigos na casa do Reginaldo (justo o colega de profissão que mais atiçara a imaginação, contando-lhe, em detalhes, as transas fabulosas com Amara, sua mulher) que Alfredo descobriu que, sexualmente, era um total imbecil. Com desenvoltura, o Reginaldo ia colocando, no vídeo-cassete, com exibição primorosa num imenso telão, os melhores filmes pornôs da sua coleção, chamando a atenção de todos para os lances mais quentes de cada fita.

- Essa posição aí é a minha preferida ! - dizia o anfitrião, sorvendo uma dose de uísque. Eu e a Amara a testamos sempre com sucesso !

- Aquela da cadeira-do-papai é sensacional ! - acrescentava o Torres, desinibido. Só que a última vez que a fiz, acabei com torcicolo !

Todos sempre tinham algum comentário a fazer, menos o Jorge, que nada fizera em toda a sua vida. Ria quando todos riam, mas estava, na realidade, pasmo com todas aquelas cenas.

Saia dessas reuniões com a certeza que era a falta de tudo aquilo que estava tornando o seu casamento uma chatice. E mais: saia com a imagem da Amara na cabeça, já que a mulher do amigo não se cansava de lançar olhares gulosos em sua direção. Logo ela, a melhor amiga da Marina !

Sem coragem para tentar qualquer coisa além do permitido na hora da transa com sua mulher, Jorge decidiu continuar no de sempre, até que um dia, quase às vésperas do carnaval, ouviu, sem querer, uma conversa de Marina com Amara, onde essa última relatava suas noites de amor com Reginaldo, sem esconder nada, contando tudo, tim-tim por tim-tim.

Como não tinha mesmo coragem de abordar a esposa a respeito do assunto, resolveu tentar algo fora. Por que não ? Todos os seus amigos, de vez em quando, viviam aventuras extraconjugais.

- É preciso variar um pouco lá fora para se conseguir muito em casa ! - repetia sempre o Serginho, o filósofo sexual e o mais safado do grupo.

Depois de pensar muito, tomou a grande decisão: sabendo que o Reginaldo estava viajando para defender uma causa e só retornaria depois do carnaval, telefonou para a casa do amigo e quem atendeu, é claro, foi a Amara.

- Jamais esperei que você, um dia, telefonasse pra mim... - disse ela.

- É.... julguei que estivesse tríste, sem ninguém pra conversar...

- E estou mesmo... chateada. Há cinco dias sem transar. Imagine.

Engoliu sêco, mas conseguiu falar.

- Amanhã tem baile à fantasia.

- Quer ir comigo?

- Claro.

- Com uma condição.

- Qual?

- Irei vestida de odalisca, com uma máscara cobrindo meu rosto. Você me identificará por uma echarpe vermelha envolvendo a cintura. Vamos nos encontrar no baile. De lá, iremos a um motel.

- Combinado.

Quando desligou o telefone, estava em êxtase: ia para um motel com Amara. O Reginaldo que o perdoasse, mas estava até lhe fazendo um favor. A mulher estava sofrendo com a solidão !

No sábado, avisou à esposa sobre o serão que teria de fazer no escritório. Que só voltaria de madrugada. Ela recomendou que não se esquecesse de se alimentar. E ele, sem mais palavras, antes que a consciência falasse mais alto e desistisse de tudo, tratou de cair fora.

No espelho do escritório, experimentou a fantasia do Zorro, seu herói preferido, e sentiu um arrepio só em pensar na Amara vestida de odalisca.

Por volta da meia-noite, o salão já estava repleto de foliões que cantavam e dançavam ao som de uma orquestra de frevos.

- Quanto riso - oh! - quanta alegria....

Seus olhos não demoraram a encontrar, sozinha, num recanto, afastada da multidão, a odalisca, com a echarpe vermelha em volta da cintura.

Os dois se abraçaram e ela o beijou ardentemente.

- Não quero ficar aqui. Quero ir pro motel - sussurrou ao seu ouvido.

- Já deixei tudo pronto. Fica aqui perto. Vamos lá - disse, nervoso.

Logo os dois estavam na suite do motel, num ambiente à meia-luz.

- A máscara... insinuou.

- Não vou tira-la. É pra manter o ar de mistério - segredou.

Inteiramente nua, a odalisca foi retirando, peça por peça, a roupa do Zorro. Sem perder tempo, ela começou a acariciar com gestos suaves, usando as mãos e a língua com excepcional maestria, levando Jorge à loucura. Uma a uma, as cenas dos filmes pornôs foram acontecendo, só que, desta vez, ele era o astro principal. Não havia pausa. Não havia cansaço. Durante várias horas os dois se entregaram ao sexo em todas as suas dimensões, como se nunca tivessem transado em suas vidas. Finalmente, após seguidos orgasmos, desfaleceram sobre a cama, com a respiração ofegante, mas felizes.

- Jamais pensei que o sexo pudesse ser tão bom ! - conseguiu dizer o Jorge. Agora, faça-me um favor. Retire a máscara. Quero ver seu rosto.

- Você fará isso.

Ao retirar a máscara, a surpresa:

- Marina ! - exclamou.

- Eu e a Amara combinamos tudo. Foi para nosso bem.

Sem dizer mais nada, ele e a esposa se abraçaram demoradamente, voltaram aos beijos frenéticos e recomeçaram uma nova transa, indo buscar forças para tanto ninguém sabe onde.

Para os dois, estava começando um eterno carnaval.

Sem mais dúvidas nem tristezas.

Sem máscaras no rosto.

Sem mais nada.

Um comentário:

  1. Deodato, conseguimos um trecho de áudio de Humberto de Campos narrando uma homenagem à Rosil Cavalcante, donde ele cita que em 1968 o senhor produzira um programa chamado "Rosil Cavalcante Sua Vida, sua mùsica". Represento o Blog Retalhos Históricos de Campina Grande (http://cgretalhos.blogspot.com) e queria saber se o senhor dispunha do áudio desse programa para que postássemos como forma de reconhecimento ao seu trabalho no rádio, além da figura biográfica do Rosil.
    Lembrando que ambos que figuraram em postagens nossas, inclusive sobre o Flama.
    Suas memórias seriam uma excelente fonte de postagens para o resgate histórico que ora realizamos, pela sua dedicação ao rádio local em seu auge.
    Um grande abraço
    Emmanuel Sousa (manneh_afb@hotmail.com)

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