SAUDADE DA MORENA
A melhor lembrança que guardo de
Clara Nunes, a morena de Angola que enlouqueceu o Brasil, foi a sua
entrada estonteante em minha sala, em 1968, quando dirigia a Rádio Sociedade da
Bahia, em Salvador, bela e envolvente nos seus 26 anos, trazendo, em suas mãos,
o segundo LP que acabára de gravar na Odeon, cujo título – Você passa, eu
acho graça – fazia parte da letra da música de Ataulfo Alves que tinha se
transformado em seu primeiro grande sucesso, tendo servido, também, para fixar
a sua voz ao nosso samba.
Logo
após ouvir a música-tema do LP e de parabenizar a jovem cantora por sua
interpretação, autorizei que a gravação fosse tocada nos principais horários da
emissora e fiz um convite à sua intérprete para que participasse de um programa
de auditório que logo iria ao ar na TV Itapuan. Clara não só aceitou o convite,
como subiu ao palco e, diante das câmeras, deu um show de canto e de rebolado,
conquistando de vez a admiração dos baianos.
Alegre
e descontraída, parecendo sempre de bem com a vida, Clara Nunes passou pela
vida como um raio de luz, iluminando os caminhos e conquistando corações com a
força dos seus encantos e das suas interpretações musicais.
Tendo
sido a caçula dos sete filhos do casal Manuel Araújo e Amélia Nunes, Clara
nasceu, no dia 12 de agosto de 1942, no distrito de Paraopeba (hoje
Caetanópolis), no município de Cedro, no interior de Minas Gerais, local onde
viveu até os 16 anos de idade. Suas primeiras ligações com a música, foi
através do pai, que era violeiro e tocava nas festas de Folia de Reis, e com o
coral da Matriz de Cruzada Eucarística, onde cantava ladainhas em latim. Com a
morte dos pais, foi morar com dois irmãos em Belo Horizonte, participando do
Coral Renascença, da igreja do bairro onde morava. Em 1960, foi a vencedora do concurso A Voz de Ouro ABC,
na fase mineira, cantando a música Serenata do Adeus, de Vinicius de
Morais. Logo depois, com a música Só Adeus, de Jair Amorim e Evaldo
Gouveia, obteve o 3º lugar na finalíssima realizada em São Paulo. Ao lado de
Milton Nascimento – Bituca -, que atuava como baixista, ela passouaparecer como
crooner de boates e, logo após, na televisão, fazendo sucesso no
programa de Hebe Camargo na TV Itacolomi, até que ganhou um show todo seu, onde
apresentava artistas de renome nacional, como Ângela Maria, Altemar Dutra e
muitos outros. Em 1965, foi para o Rio de Janeiro, onde passou a atuar nos
melhores programas de televisão. A partir de 1969, com o disco Ave Maria do
Retirante, tornou-se nacionalmente conhecida. No ano seguinte, realizou,
com Ivon Curi, um grande show em Luanda, na África. Com Toquinho e Vinicius,
percorreu o Brasil com o show O Poeta, a Moça e o Violão. E vieram os
grandes sucessos: Contos de Areia, Menino de Deus, O Mar Serenou, Juízo
Final, Macunaíma, Herói da nossa gente, A Flor da Pele, Coração Leviano, Feira
de Mangaio (do nosso Sivuca e Glorinha) e tantas outros.
Clara
morreu no Rio, dia 2 de um mês de abril igual a este,no ano de 1983, após
submeter-se à uma simples cirurgia de varises. Faz 30 anos, portanto, que ela
se foi, deixando, em seu lugar, esta imensa saudade.
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