SAUDADES DE CAYMMI
Nos anos 70, estive morando, por
quase um ano, em Salvador, na Bahia, a serviço dos Diários Associados. De
repente, lá estava eu, na terra de tantos sonhos, percorrendo as ladeiras de
Salvador, as suas muitas igrejas, o seu famoso Mercado Modelo e, pra que não
disessem que eu só fui pra lá pra fazer turismo, comecei a preparar, ao mesmo
tempo, as novas programações da Rádio Sociedade e da TV Itapuan, que eram os
veículos associados, naquela época, no estado.
Nas
minhas andanças com os colegas da empresa, em busca de contratar pessoas que
pudessem nos ajudar no lançamento das novas programações, fui apresentado à uma
figura excepcional: o escritor Guido Guerra – um jovem e talentoso contista,
bastante conhecido em todas as áreas. Foi por intermédio de Guido que
almoçamos, certo dia, com Jorge Amado e Zélia Katai, numa entrevista informal
com o casal, quando descobrimos que o maior escritor brasileiro, à época,
escrevia todos os seus livros à mão, já que nunca aprendera a usar uma máquina
de datilografia. Era ela, a sorridente Zélia, sua companheira, quem botava
ordem em todos os seus rascunhos, datilografando-os, um a um. E o que era mais
incrível - conforme confidenciou – cabia à ela a tarefa de colocar as vírgulas
e ponto-e-vírgulas que o nosso Jorge, comumente, esquecia de colocar.
Foi
com Guido Guerra, também, que fomos à festa dos 60 anos de Dorival Caymmi,
grande amigo de Jorge Amado e um dos maiores e mais festejados compositores
brasileiros de todos os tempos. Lá estávamos nós, na casa de Caymmi, na praia
de Ondina, cercado por familiares – por Stella, sua esposa, e pelos filhos,
Nana, Dori e Danilo, além de amigos e parentes – o próprio Caymmi, com seu
jeitão de eterno jovem, apagando as 60 velinhas do bonito, cheiroso e enfeitado
bolo.
Nascido
em Salvador, no dia 30 de abril de 1914, filho do funcionário público Durval
Henrique, que tocava violão, bandolim e piano, e de Dona Sinhá, como sempre foi
conhecida a sua mãe, Aurelina Cândida Caymmi, Dorival logo se aventurou pelo
mundo da música. Em 1939, Caymmi já lançava, com Carmen Miranda, seu primeiro
grande sucesso O que é que a baiana tem ?
E vieram outros eternos sucessos da nossa música popular, como Boneca de Pixe, Na Baixa do Sapateiro, O
Mar, O Samba da Minha Terra, Quem Não Gosta de Samba, É Doce Morrer no Mar
(em parceria com seu amigo Jorge Amado), A
Jangada Voltou Só, Requebre que eu dou um Doce, Vatapá, Rosa Morena, Marina,
Gabriela, Nunca Mais, Sábado em Copacabana, Não Tem Solução e o célebre... Você Já Foi à Bahia ?, além de muitas
outras páginas do nosso cancioneiro.
Foi
esse o Dorival Caymmi que conheci há mais de 30 anos - o mesmo jovem que, no
dia 16 de agosto de 2008, resolveu partir para a eternidade, aos 94 anos,
deixando tristes e saudosos todos os seus amigos e admiradores espalhados por
esse imenso Brasil.
Já
faz quase cinco anos, portanto, que o nosso Caymmi deu um pulo ali no céu, mergulhou
na eternidade e nunca mais voltou.
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